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Mais drama do que corrida: A fórmula de Michael Mann funciona em "Ferrari"?

"Ferrari" não mostra só o que há na pista, mas também o que há por trás dela

Enzo e equipe no filme Ferrari
[Imagem: Enzo e equipe no filme Ferrari / Neon]

Michael Mann, grande cineasta estadunidense, seja em Collateral (2004), Heat (1995), ou mais conhecido como Fogo contra Fogo, e The Insider (1999), conhecido também como O Informante, mostra a frente masculina de maneira perigosa, desmistificando a complexidade de cada personagem representado nela. Dessa forma, o drama, a cinematografia estilosa e as emoções condensadas nesses dois tópicos, predominam na jornada construída no enredo de cada um dos filmes. 


Mann constrói seus protagonistas como figuras solitárias, muitas vezes trágicas, que vivem em um mundo de regras próprias, em seu ofício. Eles são homens de ação, mas também pulverizados pela reflexão e a dramaturgia, lidando com dilemas morais densos.


Neil McCauley e Vincent Hanna, de Heat, são dois lados da mesma moeda, vivendo em um equilíbrio perigoso entre dever e obsessão. Vincent, o assassino frio de Collateral, é a personificação da fatalidade, enquanto Max descobre a coragem que nunca soube ter. Jeffrey Wigand, de The Insider, enfrenta um sistema poderoso, sacrificando sua própria paz.


Já em Ferrari (2023), Enzo (Adam Driver), o protagonista, o qual representa o fundador da scuderia e fábrica de automóveis da marca, é um homem que construiu um império, mas vive atormentado por perdas pessoais e pela pressão de manter sua marca de carros esportivos no topo. Ele é um líder carismático, mas também um homem dividido entre sua família e sua obsessão pela velocidade. Como os outros personagens de Mann, Enzo Ferrari é um homem que vive segundo suas próprias regras, enfrentando desafios que testam seus limites pessoais, tendo a ambição como seu norteador. 


E os bastidores por trás dos pódios e autódromos são mais do que necessários para contar a história da Ferrari, afinal: desafios de uma marca, uma scuderia, vão além do que se vê em corridas. 


O filme retrata a crise financeira da Scuderia Ferrari. A empresa está à beira da falência, e Enzo aposta tudo na corrida Mille Miglia - competição de velocidade em estrada aberta, percorrendo cerca de 1.600 km entre Brescia e Roma, na Itália - como uma forma de salvar a Ferrari, em 1957. Assim, Enzo lida com a pressão de vencer, mas também enfrenta o risco de perder tudo.


A corrida Mille Miglia no filme Ferrari
[Imagem: A corrida Mille Miglia | Neon]

Além disso, na corrida, nada ocorre bem. O piloto espanhol Alfonso de Portago e seu co-piloto Edmund Nelson estavam competindo com uma Ferrari 335 S quando um pneu estourou próximo à vila de Guidizzolo, na Itália. O carro perdeu o controle e colidiu com espectadores, resultando na morte dos dois competidores e de nove espectadores, incluindo crianças. Na trama, isso acontece de forma idêntica, e a cena do acidente é explícita, quase que inesperada a quem não sabe o que aconteceu há 68 anos atrás.


Em meio a este cenário, no centro de tudo está Enzo Ferrari, retratado como um líder obsessivo e estrategista implacável, lutando para manter sua empresa no topo enquanto enfrenta perdas pessoais e conflitos internos.


Apesar disso, o clima de tensão em outras vertentes do filme, bem como a ambientação e a fotografia de alto contraste, low-key lighting, mostra que não há nada de confortável e feliz desde o início. Os tons sépia com elementos vermelhos, além de fortalecer a scuderia, trazem destaque ao perigo e ao mistério que a marca preserva: a vida pessoal de Enzo.


Na vida familiar de Enzo, a situação é igualmente delicada. Ele ainda sofre com a morte de seu filho Dino, que faleceu em 1956 aos 24 anos, abalando profundamente seu casamento com Laura (Penélope Cruz), que é construída como uma personagem forte e decidida. Ao mesmo tempo, mantém uma relação extraconjugal com Lina Lardi (Shailene Woodley), com quem teve um filho, Piero. Essa vida dupla gera tensão constante, especialmente porque a sociedade italiana da época não permitia o reconhecimento legal de Piero enquanto Laura estivesse viva.


Penélope Cruz em Ferrari
[Imagem: Penélope Cruz em Ferrari | Neon]

E, nesse sentido, a fotografia, marcada por tons sóbrios e iluminação dramática, reforça a atmosfera de tensão, traduzindo visualmente o peso das decisões do protagonista. A cenografia, detalhista e precisa, recria a Itália dos anos 1950, dando autenticidade à narrativa e ampliando a imersão no mundo do automobilismo.


Dessa forma, Ferrari retrata Enzo como um homem dividido entre a paixão pelas corridas e os fantasmas de sua vida pessoal — um retrato intenso de uma figura importante ao automobilismo que, mesmo cercado por velocidade, não consegue escapar dos próprios conflitos. O melodrama - gênero que enfatiza emoções, conflitos morais e personagens que enfrentam grandes desafios, originado no século XVIII - se faz presente no longa do início ao fim, visto sua capacidade de mostrar a trama além do automobilismo.


Adam Driver, Sarah Godon e Gabriel Leone em Ferrari
[Imagem: Adam Driver, Sarah Godon e Gabriel Leone em Ferrari | Neon]

O longa também é sobre o custo da ambição e, junto da atuação de Adam Driver, Enzo se torna um homem com ar enigmático, tornando cada expressão e silêncio impactantes e desconfortáveis. Os cenários italianos e a fotografia misteriosa mostram sua vida com algo perigoso, instável e emergente, ditado pela cor vermelha, que está viva até hoje, com Piero Ferrari, mesmo por muito tempo escondido e distante, fazendo parte do legado criado por seu pai que faleceu nos anos 80.



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